Residência em neurologia pediátrica Sabará-Pensi integra clínica, ciência e impacto social
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Residência em neurologia pediátrica Sabará-Pensi integra clínica, ciência e impacto social

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Curso aprovado para 2026 combina UTI neurológica, estágios no SUS e benefícios inéditos para responder à demanda crescente por diagnósticos precisos na infância. O processo seletivo será feito no final de 2025, para início em 1º de março de 2026, como todas as residências do país. “Um residente precisa ver desde a meningite aguda até o avanço de terapias genéticas para epilepsia refratária”, explica Regina Grigolli Cesar, coordenadora da Coreme e da UTI do Sabará Hospital Infantil

A carência de neuropediatras bem formados no Brasil já se converteu em obstáculo sanitário. Filas de espera se estendem por meses no Sistema Único de Saúde e, mesmo no setor privado, pais percorrem longas distâncias em busca de diagnóstico preciso para crises epilépticas, transtornos de neurodesenvolvimento e doenças raras. “Foi devido a essa lacuna que o Instituto Pensi e o Sabará Hospital Infantil decidiram criar o Programa de Residência Médica em Neurologia Pediátrica (PRM‑NP), que foi aprovado em 27 de março de 2025. O processo seletivo será feito no final de 2025, para início em 1º de março  de 2026, como todas as residências do país e, desta forma, poderemos contribuir na formação de profissionais qualificados nesta área tão essencial do desenvolvimento da criança e adolescente”, diz a neurologista Clarissa Bueno, do Departamento de Neurologia da Faculdade de Medicina da USP, médica do Sabará Hospital Infantil e supervisora do novo programa.

Como explicou a chefe do departamento do Ensino Ana Luiza Navas na entrevista sobre o programa, o desafio de formar neuropediatras não se limita ao domínio técnico: envolve articular clínica complexa, pesquisa de ponta e advocacy por políticas públicas que coloquem o desenvolvimento infantil no centro da agenda sanitária.

A iniciativa representa a maturação de seis anos de experiência em residência pediátrica. “Chegou a hora de avançarmos para subespecialidades que façam diferença direta na vida das crianças”, resume a gerente de ensino Andréa Kurashima, lembrando que a pediatria geral foi a porta de entrada para um projeto educacional mais ambicioso. O novo curso nasce com duas vagas anuais, preceptores dedicados e uma engrenagem que articula leito hospitalar, ambulatórios especializados, laboratório e ação social.

Para garantir amplitude de cenários, o currículo combina plantões em UTI de alta complexidade e estágios obrigatórios em hospitais públicos parceiros, como Unifesp, Santa Casa e FMABC. “Um residente precisa ver desde a meningite aguda até o avanço de terapias genéticas para epilepsia refratária”, explica Regina Grigolli Cesar, coordenadora da Coreme e da UTI. Aos incentivos tradicionais somam‑se benefícios raros no país: bolsa para estágio optativo internacional, auxílio‑moradia, estímulo à participação em congressos, acesso total à biblioteca digital e salas de plantão concebidas para reduzir fadiga.

Até o fim de novembro, todas as parcerias externas devem estar contratualizadas; o edital já está divulgado e, no início de 2026, os primeiros residentes desembarcam em um ambiente cujo slogan interno é simples: “Formar aprendizes, não executores”. A partir daí, começa a história que esta matéria detalha.

DRA CLARISSA BUENO.jpgNeurologista Clarissa Bueno, do Departamento de Neurologia da Faculdade de Medicina da USP, médica do Sabará Hospital Infantil e supervisora do novo programa.

“Quando o Instituto Pensi abriu a residência em pediatria, já se sabia que a neurologia infantil seria um dos próximos passos”, explica Andréa, sentada diante de um fluxograma que cruza competências clínicas, laboratórios de pesquisa e projetos de advocacy. O desenho percorre quatro eixos: diagnóstico precoce, tratamento integral, pesquisa translacional e impacto social. Cada eixo corresponde a módulos de formação que se alternam ao longo dos programas de residência médica do Instituto Pensi & Sabará Hospital Infantil.

“Nos nossos programas de residência se aprende muito mais que medicina de ponta — aprende-se trabalho em equipe e humanidade.”

Andréa Kurashima

Regina conta que o primeiro rascunho do PRM‑NP nasceu na UTI neurológica, onde a equipe percebeu que muitos médicos chegavam com base sólida em clínica neurológica de adultos, mas insegurança diante de recém‑nascidos com crises sutis ou de crianças com hipertensão intracraniana. “A criança não é um pequeno adulto; parâmetros vitais, metabolismo e até farmacologia mudam”, diz ela. A lacuna ficou visível em casos de meningite viral que evoluíram para sequelas por atraso no diagnóstico, ou em pacientes com autismo encaminhados para avaliação tardia de epilepsia.

Foi nesse contexto que surgiu o interesse de convidar o neurologista pediátrico  Carlos Takeuchi, há 25 anos mergulhado na especialidade, para participar como consultor e preceptor. Sua visão sobre o campo ajudou a refinar o currículo. “A neurologia infantil oferece múltiplas facetas de atuação, mas exige 11 ou 12 anos de formação; nosso programa busca diminuir a curva de maturação sem perder profundidade”, comenta ele (leia quadro no fim desta matéria).

A promessa de estágio optativo internacional — bolsa oferecida pela Fundação José Luiz Setúbal — responde a duas demandas. A primeira é acadêmica: expor o residente a centros de epileptologia ou neuroimagem avançada. A segunda é institucional: multiplicar a rede global que hoje inclui Johns Hopkins, Pittsburgh e Madri. “Uma experiência fora do país possibilita ao residente troca de experiência, aprendizado e incorporação de tecnologias”, diz Andréa, citando a ex-residente Paola Suhet — protagonista da terceira matéria desta edição. Trajetórias de residentes como Paola   — que compartilha sua experiência, pela primeira vez, em depoimento exclusivo neste link — ilustram o caminho que o PRM‑NP quer institucionalizar: aprendizado imersivo, troca internacional e retorno ao país com soluções que aproximem diagnóstico preciso e terapia adequada.

No dia a dia, a carga horária se reparte entre ambulatório, enfermarias e UTI, com ênfase em monitorização neurológica contínua, exames de imagem complementares e discussão multidisciplinar. A tecnologia não está presente apenas nas salas de comando; ela apoia aulas híbridas, discussão de artigos e supervisão especializada. A dra. Regina destaca que o modelo avaliativo privilegia feedback em tempo real de avaliações teóricas e práticas com casos simulados. A lógica é igual à de ensaios clínicos: iterar, ajustar e consolidar.

Um dos módulos mais aguardados é o de pesquisa translacional, ancorado em laboratórios que estudam biomarcadores de autismo e neuroinflamação. Os residentes podem atuar também como tutores de graduandos, participar de ensaios de fase 2 ou acompanhar coortes observacionais.

A integração com o Departamento de Pesquisa em Filantropia e Ciências Sociais do Pensi reforça a noção de ciclo completo: do microscópio à política pública. Quando a fundação enviar equipes a comunidades ribeirinhas, residentes terão oportunidade de discutir com profissionais locais, aprender e contribuir com diferentes realidades, tendo acesso a experiências valiosas para profissionais em formação.

A formação uniprofissional e multiprofissional também pesa. A instituição almeja propor, junto à Comissão Nacional de Residência Multiprofissional em Saúde, diversos programas de residência uni e multiprofissionais. “Com esses programas, contribuiremos para a formação de equipes especializadas, buscando a melhor abordagem à criança e adolescente”, acrescenta Andréa.

unnamed-1.jpgNovo programa destaca a experiência internacional das residências Sabará-Pensi. Na foto a dra. Marcelle Quintanilha Estefano (à direita) durante o Congresso Brasileiro de Medicina Intensiva Pediátrica, em Belo Horizonte, com a dra. Ericka Fink, uma de suas preceptoras na UTI de Neurointensivismo do Children Hospital of Pittsburgh

“Estar no Sabará, um hospital referência no cuidado infantil, foi o que me incentivou a buscar o estágio internacional; eu me sentia capacitada para esse desafio”, diz a dra. Marcelle Quintanilha Estefano, egressa do PRM Medicina Intensiva Pediátrica. “Durante a residência, tive a oportunidade de conhecer diversos serviços, tanto públicos quanto particulares, e esse contato me fez querer ampliar os horizontes também para serviços internacionais.” No estágio de 30 dias em Pittsburgh, ela reconheceu a mesma lógica que aprendera aqui: “O que mais me surpreendeu pela similaridade com nosso serviço foi a importância da equipe multidisciplinar no cuidado ao paciente crítico”; as discussões diárias reuniam médico diarista, residentes, especialistas, enfermeiros, cuidadores, farmacêuticos, fisioterapeutas e nutricionistas, essenciais para definir a linha de cuidado e fortalecer o vínculo com as famílias. Para quem mira as duas primeiras vagas de 2026, ela resume: “Vocês estarão em um dos melhores hospitais do país, especializado no cuidado das crianças, que conta com tecnologia de ponta e uma equipe sempre pronta para oferecer o melhor”.

No núcleo duro da assistência, a UTI neurológica serve de laboratório vivo. Ali, o residente domina desde a punção lombar em situação crítica até a conversa delicada que traduz prognósticos complexos.

É nesse ponto que outra frase de Takeuchi chega como aviso aos futuros candidatos: “O atendimento infantil exige exames sob anestesia e equipes afinadas; quem não conhece essa dinâmica erra na execução e na comunicação com a família” (leia o quadro ao final desta matéria).

A engrenagem educacional inclui, ainda, indicadores de impacto. O principal, explica Andréa, será a absorção dos egressos do Sabará, que está em expansão. O segundo, a criação de polos de neurologia pediátrica em regiões desassistidas. Um importante indicador interno é a qualidade de formação do residente, incluindo aprovação em prova de título e em programas de subespecialidade, além de absorção no Sabará Hospital Infantil e em instituições de referência. Os números iniciais, diz ela, “já mostram alta retenção em hospitais de excelência”.


“Formar neuropediatras de ponta exige tempo. Vamos começar já”

Carlos Takeuchi (20).jpgO neurologista Carlos Takeuchi descreve lacunas clínicas e explica por que o novo programa reduz a curva de maturação sem perder profundidade

“Eu vejo a neurologia infantil como especialidade fantástica, visto que estou imerso nela há 25 anos. Os desafios são múltiplos, a começar pelo tempo de formação, seis anos de faculdade, mais três de residência de pediatria, mais dois anos de residência de neurologia infantil. Posto isso, temos uma pessoa que irá entrar no mercado de trabalho após 11 ou 12 anos de formação básica. Isso é muito tempo, até porque não é fácil entrar na faculdade.

“A especialidade é carente de profissionais bem formados e permite atendimento em múltiplas facetas: ambulatorial, tanto na saúde privada quanto na suplementar e na saúde pública. O perfil de pacientes acometidos é bastante semelhante; o que pode mudar um pouco é o tempo de chegada ao profissional. Permite ainda uma face hospitalar, agora em dois ambientes, público e no de saúde suplementar.

“Uma vez entendida essa etapa, no atendimento ambulatorial temos a possibilidade de atuação nas múltiplas doenças do sistema nervoso que acometem as crianças, desde os quadros malformativos, que irão manifestar‑se por atraso do desenvolvimento, crises epiléticas e distúrbios de comportamento. Temos também uma grande parcela de pacientes que nos procuram por transtornos do neurodesenvolvimento e suas comorbidades. Existem ainda os pacientes com as várias formas de epilepsia, desde aquelas bastante benignas até formas muito refratárias, que são muito trabalhosas. Outra parcela importante que nos procura é a dos pacientes com manifestação neurológica de doenças sistêmicas pediátricas.

“Dentro do ambiente hospitalar, temos ainda os quadros infecciosos, como meningites e meningoencefalites, quadros de hipertensão intracraniana, epilepsias descompensadas ou recém-diagnosticadas. Além disso, parte dos pacientes com transtorno do neurodesenvolvimento pode ter complicações agudas que os levam ao hospital.

“Com frequência ou quase sempre, precisamos de suporte de exames diagnósticos especializados, muitas vezes com anestesia por causa da não colaboração por parte dos pacientes, de forma que essa peculiaridade dificulta muito o atendimento em centros não preparados para receber essa população. Da mesma forma, precisamos ter treinamento específico para abordagem das famílias para explicar todo o processo de realização de exames, muitas vezes diferente do que se faz nos adultos e em pacientes que colaboram. O exame é o mesmo; o que muda é a forma de execução, e isso nem sempre é compreendido pelos pais.

“Como mencionado anteriormente, muitos dos nossos pacientes apresentam transtornos do desenvolvimento, de forma que o atendimento e o acompanhamento da equipe multidisciplinar de reabilitação passam a ser fundamentais. Do mesmo modo, alguns pacientes fazem uso de medicações que necessitam diluições e/ou ingerem tantas medicações que o enfermeiro precisa ajudar no aprazamento de todas elas. Todos precisam estar em sintonia para que não haja erros ou distocias* de comunicação.”

Por Rede Galápagos

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Comunicação PENSI

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